quarta-feira, 25 de março de 2020

Covid-19 Dia Zero




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     Levanto-me de manhã cedo. Abro os olhos e momentaneamente parece tudo normal. E assim é se o pensamento não nos arrastar para o que já está para trás.
De repente começo a vir a mim, após pequenos “flashes” de bons sonhos, vá-se lá saber porquê, caio logo na realidade, o Covid-19 está lá fora. 
Vou ter que o enfrentar.
Um vírus em fúria com vontade de destruir a humanidade. Uma guerra declarada por um inimigo que não conhecíamos nem ninguém esperava, sem ameaças sem avisos, sem preparação, sem motivos. Pensamos nós!
Uma pandemia que varre tudo desde a China ao resto do mundo.
Preparo-me e saio de casa.
Começo a circular por estes cerca de cinco quilómetros até à Esquadra.
É rápido, principalmente quando não se vê pingo de gente, a não ser um ou outro de carro que ainda resiliente ou necessitado vai a caminho do seu dever profissional.
Este vazio que encontro já me faz pensar e observar. Aliás traz-me novas percepções. Novos pormenores que me escapavam.
E de repente dou por mim a pensar que o verde já está mais vivo, reparo nalgumas flores que desabrocham, coisa que já me havia esquecido de reparar por entre estas altas pedras de cimento plantadas a estreitar as ruas que nos escondem outras realidades.
Reparo noutros pormenores mais adiante, ah! que engraçado os passarinhos a esvoaçar à minha frente. Mas isso já não existia por estas bandas?
Devia haver, eu é que andava distraído com outras sensações, preenchido com as realidades citadinas, afinal já me tornei há muito um “hurbanoide”. Teso mas a crer-me parecer que quando chego à terra me olham como se fosse alguém importante, lá da cidade.
Mas a realidade do corona tudo fará mudar e de que forma, se ainda mal está a começar e já me põe a ver o mundo diferente. Tão diferente que dou por mim a reparar em realidades que já me escapavam.
Chego ao trabalho, mais um alerta, pássaros à porta. O silêncio das ruas ainda está a começar e já vejo o à-vontade das aves. A pavonearem-se à minha frente como que sem medo e querer demonstrar que agora todos os espaços abertos já são seus.
Fiquei impressionado. Como é que em dois ou três dias o mundo muda assim tão de repente?
Que panaceia este Covid para os bichos. Será que de repente vai começar a aparecer a bicharada pelas ruas sem pedir licença ao homem, sem ter que fugir e com toda esta espontaneidade! Parece.
Vamos lá ao trabalho, que é dia de começar a nossa luta contra o mal. Contra inimigo sem rosto, o assassino que nos está a confinar a quatro paredes, sem tréguas, que nos rouba a alegria, os afectos, os beijos os abraços.
Metemo-nos no carro e lá vamos nós enfrentar os inimigos do inimigo, ou melhor, os espertos, os teimosos, os displicentes ou incautos, ou que seja até apenas os desleixados e porque não os distraídos ou mesmo os necessitados.
É preciso ir para a rua espalhar a palavra, mesmo que seja só pela nossa presença quando ela ainda se impõe, ainda que só pelo respeito nalguma educação que nos resta.
A ordem é descrita:
-Vão para as zonas mais movimentadas e parem junto a estabelecimentos mais frequentados e vão impondo a lei pela palavra, que o povo é calmo e sereno.
Começam a notar-se os pequenos passeios matinais ou higiénicos, a que alguns não conseguem resistir, ou até outros adoram transgredir, nem que seja para medir o pulso às autoridades.
Passeia-se o cão, vai-se à farmácia, veste-se o fato de treino e é desta que lhe damos o uso certo, num “jogging” há tanto adiado.
-Vou comprar pão e assim tomo o meu habitual café matinal lá fora.
E tantas outras coisas, como açambarcamentos depois de longas filas no supermercado, mas tudo bem.
É interessante ver a psicologia do medo.
Passa a hora do almoço, vamos a mais uma ronda, ver como a populaça se comporta com a nova realidade.
Uma esplanada aberta como se nada estivesse proibido e toda a gente como lagartos ao sol ali se “esperneiam”, como se nada fosse, não tivessem acabado afinal os futebóis.
Para-se o Carro Patrulha, a ver se se espantam e ganham vergonha.
Alguns de uma forma acabrunhada lá se vão pondo a andar depois de um olhar incisivo da Polícia como que a avisar que as leis são para cumprir.
Espreita-se lá para dentro, lá estão uns quantos ancorados no balcão, vêem as noticias que podiam ver em casa, espalham mais uns vírus da boca pra fora e «tásse bem».
Entra-se em acção e explica-se as novas leis da República.
-Ah! eu tenho serviço de “take away” e tenho aqui os clientes à espera.
E andamos nisto, qual cornona qual quê!
Mais umas voltas para novas paragens.
Um café com ajuntamentos à porta?
Vamos verificar.
Mais um a transgredir. Umas “jolas” para amigos que o vírus assim é que morre… qual corona qual quê!
Vamos espreitar o paredão.
Está tudo a atropelar-se uns aos outros, como formigas em carreiro, mas a pretexto do ar puro que vem do mar ou do “fitness”. Que se lixe o Covid que ele ainda não há-de andar por estas bandas.
Mais uma paragem para sensibilizar e verificar comportamentos.
-Olha ali aquele café com porta aberta pelas traseiras com aquele corrupio de gente!
Entre outras, assim se passou o dia.
Acabou-se o trabalho, vamos para casa tomar um banhinho desinfectar-nos bem, lavar esta roupa que o perigo está sempre à espreita. 
Tenha um bom covid.
Que o diabo seja cego, surdo e mudo!

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